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Foto: Isac Nóbrega/PR
Então ajudante de ordens do presidente Jair Bolsonaro (PL), o tenente-coronel Mauro Cid tratou de um golpe de Estado com oficiais do Exército, após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas urnas em 2022. A acusação está no relatório da PF sobre o caso, que foi encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF) na última quinta-feira (21). O documento, ao qual a equipe de O TEMPO em Brasília teve acesso, traz dezenas de diálogos em áudio e texto trocados pelos investigados.
Em uma das mensagens de áudio, enviada por aplicativo, Mauro Cid fala ao general Mario Fernandes, que era o número 2 da Secretaria-Geral da Presidência, sobre a necessidade de o suposto plano ser colocado em prática “antes do dia 12”. Investigadores concluíram que a dupla cita o 12 de dezembro de 2022, data para a diplomação da chapa Lula e Geraldo Alckmin, que marcaria o reconhecimento da eleição de ambos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
“Dia 12 seria… Teria que ser antes do dia 12, né? Mas com certeza não vai acontecer nada. E sobre os caminhões, pode deixar que eu vou comentar com ele, porque o Exército não pode ‘papar mosca’ de novo, né? É área militar, ninguém vai se meter”, diz Cid. O “ele”, segundo a PF, é Bolsonaro. Já os “caminhões” são os veículos enviados por fazendeiros para o Quartel General do Exército, em Brasília, para engrossar o acampamento que pedia intervenção militar contra a posse de Lula.
No mesmo diálogo, Cid garante que vai conversar com Bolsonaro. “Não, pode deixar, general. Vou conversar com o presidente. O negócio é que ele tem essa personalidade às vezes, né? Ele espera, espera, espera, espera pra ver até onde vai, né? Ver os apoios que tem. Só que às vezes o tempo tá curto, né? Não dá pra esperar muito mais passar, né?’”, afirma o tenente-coronel. Ele firmou acordo de delação com a PF, dando informações sobre esta investigação e outras que envolvem Bolsonaro.
Indiciado há quatro dias, com Cid, Fernandes e outros 34, Bolsonaro desembarcou em Brasília nesta segunda-feira (25) e negou participação na trama golpista identificada em inquérito da PF. “Uma loucura falar em golpe, uma loucura. Golpe com um general da reserva e cinco oficiais? E outra coisa, golpe existe em cima de uma autoridade constituída, que já tomou posse. O Lula tinha tomado posse? Ninguém tinha tomado posse. Só se fosse em cima de mim o golpe”, declarou Bolsonaro na chegada à capital.
Já o general Mario Fernandes foi preso pela PF na Operação Contragolpe, na última terça-feira (19), com outros três militares do Exército e um agente da Polícia Federal acusados de planejar um golpe de Estado com assassinatos da chapa presidencial vencedora de 2022 e do ministro Alexandre de Moraes, do STF e TSE. Fernandes é apontado como um dos principais incentivadores da ruptura institucional e mentor do plano “Punhal verde amarelo”, que previa as execuções das autoridades,
Áudios atribuídos ao general Fernandes mostram como ele tinha a intenção de envolver as Forças Armadas no suposto plano de golpe de Estado de 2022, apontado em inquérito da PF que, concluído na quinta, culminou no indiciamento de 37 pessoas, incluindo Bolsonaro, Mauro Cid e diversos outros militares de alta patente do Exército.
“Durante a conversa que eu tive com o presidente, ele citou que o dia 12, pela diplomação do vagabundo, não seria uma restrição? Qualquer ação nossa pode acontecer até 31 de dezembro. Tudo. Mas aí na hora: pô, presidente. A gente já perdeu tantas oportunidades”, mostra o áudio.
Em 12 de dezembro de 2022, logo após a cerimônia de diplomação, apoiadores de Bolsonaro tentaram invadir a sede da PF, na área central de Brasília, e incendiaram carros e ônibus, além de quebrar vidraças de prédios particulares. Investigação mostrou que o grupo havia saído do acampamento em frente ao QG do Exército.
O grupo tentou invadir a PF para libertar o Cacique Tserere Xavante, um indígena bolsonarista preso momentos antes, perto do STF, com a intenção de atacar o prédio. Sem conseguir entrar no STF, apoiadores de Bolsonaro passaram a quebrar o que viam pela frente. Três deles foram presos após planejar o atentado a bomba no aeroporto de Brasília em 24 de dezembro de 2022.
“Tu viu que já começaram a radicalizar, né? A prisão do cacique ali já levou. Ó, aqui no início da Asa Norte, da W3 Norte, na sede da Polícia Federal, o pau tá comendo. Os distúrbios urbanos já iniciaram. Agora vai rolar sangue”, comemorou o general Mário Fernandes em áudio enviado ao coronel do Exército Reginaldo Vieira de Abreu, conhecido como Velame.
O general Mário Fernandes também demonstrou empolgação com os atos de vandalismo em conversa com o general Luiz Eduardo Ramos, ex-ministro de Bolsonaro. “Vai começar a rolar sangue. E nós sabemos que isso aí já era um prenúncio, já era anunciado. Certo? Vai acontecer, porra, não tem jeito. Quanto mais se retardar uma ação efetiva, mais vão acontecer eventos como esse”, disse Fernandes.
A PF afirma que os acampamentos em frente a quartéis do Exército após a derrota de Bolsonaro nas urnas faziam parte de um movimento orquestrado pelos militares e que o general Fernandes se comunicava frequentemente com esses grupos, mas que “os principais diálogos em torno de temas antidemocráticos e/ou relacionados aos ideários golpistas” eram travados com militares.
“Talvez seja isso que o alto comando, que a defesa quer. O clamor popular, como foi em 64. Nem que seja pra inflamar a massa. Para que ela se mantenha nas ruas”, afirma o general em áudios que circulavam nos grupos de apoiadores da intervenção militar. Ele se refere ao golpe de 1964, que derrubou um presidente civil eleito democraticamente e deu início a uma ditadura militar, que durou até 1985.
Fonte: O Tempo