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Segundo o deputado General Girão, condenado pela Justiça Federal do Rio Grande do Norte ao pagamento de R$ 2 milhões por incentivar os atos antidemocráticos após as eleições de 2022, parece estar em curso uma tentativa de controlar até mesmo o conteúdo dos pensamentos individuais — o que revela um conceito bastante maleável de direitos humanos. “Hoje nós estamos no Brasil com a proibição, a punição, o crime de pensar. Como é que pode alguém, uma autoridade, querer impedir as pessoas de pensarem?”, questionou.
Quando MC Poze canta sobre a realidade violenta das favelas, muitos são rápidos em rotular suas letras como “apologia ao crime” — como já fez um conhecido grupo da extrema direita brasileira e natalense. Mas quando um deputado federal como General Girão (PL-RN) diz que “primeiro vocês atiram, depois vocês perguntam”, a reação esperada é mais branda, menos acalorada. Afinal, retratar a violência do cotidiano através da música geralmente é tratado como apologia. O que seriam, então, declarações públicas que defendem o uso letal da força sem mediação, feitas por um agente político com responsabilidades institucionais? O que seria “entrar na favela e deixar corpo no chão”, tantas vezes cantado?
General Girão não fala do lugar de um cidadão comum, mas sim como uma autoridade com “experiência como secretário de Segurança e mais de oito anos de atuação na área”, conforme ele mesmo ressaltou. A frase “se o cara está armado, ele não está com boas intenções com você” pode até parecer lógica, mas só agrada sua base bolsonarista — e ainda contrasta com a realidade de um país que tem a polícia que mais mata e também a que mais morre no mundo. Além disso, desconsidera o devido processo legal e o risco de execuções sumárias.
Mais do que uma opinião isolada, a fala do deputado expressa uma visão perigosa de Estado, onde a presunção de culpa substitui o direito à vida. O Brasil já enfrenta um histórico dramático de letalidade policial — naturalizar esse tipo de discurso é perigoso e desumano. Se a liberdade de expressão serve para justificar tais falas, por que então criminalizamos artistas por letras de funk, rap ou trap que retratam — e não necessariamente incentivam — a violência?
E são justamente essas figuras que hoje clamam por uma “anistia humanitária”, como se só agora tivessem descoberto o sentido da expressão “direitos humanos” — num país onde agentes públicos ainda jogam pessoas de pontes.